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Conto, Eu que escrevo tanto!

por Jorge Soares, em 01.09.12
Eu que escrevo tanto
Imagem de aqui

O mundo insiste nos pequenos textos e isso me incomoda. Tenho tanto a dizer... E se ninguém me lê, me escuta, ainda assim tenho muito a dizer. Sou isso, intensa, desordenada com as palavras. E com a vida. Amo, odeio, adoro. Nunca aprendi a gostar ou desgostar com olhos baixos, traços inertes, voz de falsete. Preciso da intensidade dos verbos, da sonoridade da fala, do avolumado das linhas completadas por letras que junto ou separo como me compraz.
Não sou mini. Não sei me conter em caracteres. Nem quero. Quero des-conter tudo o que se chamar emoção, tudo o que puder ser praticado com volúpia.

O tamanho de um texto é como o tamanho de um falo: em excesso, machuca; em escassez, frustra. Escrever um texto mais longo é como prolongar o sexo. Há que se ter beijo na boca, preliminares, arrepios na nuca, língua no ouvido. Que se ir descendo com calma e tesão até o umbigo, e passear as unhas nas costas, e sentir o pulsar gradativo das veias, do coração, do membro cheio de desejo. Até que tudo jorre em final. E se faça o silêncio. Silêncio de aconchego.

 

Mas me dizem os senhores da razão que um texto, um texto bom precisa começar já num impacto, sem os preâmbulos do crescendo. Dizem que o escrever moderno precisa ser assim: chocar o leitor na primeira frase e só depois contar a história. Sem explicar, sem introduzir. Curto, letal, total.
Eles dizem. Eu ouço. Mas não creio que escute. Talvez eles falem muito rapidamente, como os textos que propõem. Talvez eu escute muito lentamente, e não assimile o que me dizem.

Gosto de caminhar e de correr. Mas reservo às letras os passos. À vida, velocidade. E que ninguém se iluda sobre inverter essa fórmula. Nada acontece sem preço.

Se me deixo colher pelas poucas palavras, ou pelos textos diretos, ainda assim corro riscos. Se caminho lentamente pela vida, ainda assim corro riscos. Num caso, o de não dizer tudo o que quero, o de esquecer-me de coisas importantes. No outro, o de pensar que o tempo me sobra, ou que na lentidão serei melhor aceita, melhor compreendida, melhor amada, melhor avaliada.

Da façanha em dizer tudo com pouco resta-me a conclusão de que não tenho mesmo vocação para tamanha elegância. Sou mulher de cais, de taverna. Sou massa de moldagem. Estico-me nas palavras, tomo cores e formas; todas as cores, todas as formas e, ainda, todos os cheiros.

Sou as palavras que escrevo. Muitas, amplas, tolas, desconexas. E, no entanto, repletas de começo, meio e fins variados.

Um dia, ainda pretendo ser como eles, que comandam os modismos e as razões. Quero ser séria, contida, inteligente. Quero fazer referências sutis, jamais ser um dedo que aponta. Quero ser um olhar que diz tanto, ao invés de palavras que se multiplicam assanhadas. Um dia, preciso aprender a ter mistérios, a ser mistérios.

Só não sei ainda o que farei com as emoções engolidas, com os argumentos imergidos, com os pensamentos mutilados. Os senhores da razão ainda não me contaram essa parte da história.

CINTHIA KRIEMLER

Retirado de Samizdat

publicado às 21:38


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