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Eu no história Devida VI

por Jorge Soares, em 18.06.09

Gistória Devida

 

Depois de O Quebra cabeças de arame, de O perfume daquela rosa, de A carta, de  O Caminho dos Medronhos e de O menino Valente  agora foi a vez de A bola de Berlim

 

Recebi o seguinte email da Antena 1:

 

Caro Jorge Soares:

No Domingo, dia 21 de Junho, vamos ler a história que nos enviou, «A Bola de Berlim», numa emissão que tem como convidado o actor e encenador Tiago Rodrigues.

Pode ouvi-la na Antena 1, a partir das 13h.

Para se manter actualizado em relação ao programa, consulte o nosso blogue: ahistoriadevida.blogs.sapo.pt

Cumprimentos, e boas histórias,
Inês Fonseca Santos.

 

Acho que se me acabaram as histórias...... vamos ver, entretanto, este é o texto que vai ser lido no próximo Domingo:

 

A Bola de Berlim

 

 

No outro dia em Oliveira de Azeméis numa das muitas pastelarias que por lá há, observávamos a quantidade e variedade de bolos que enchiam as montras  e em jeito de provocação eu  insistia com a R. para que escolhesse um. A minha filha não gosta de bolos, coisas doces e/ou com creme não são com ela. Na montra havia um tabuleiro cheio de bolas de Berlim, enormes, frescas e com aspecto delicioso, com montes de creme. É claro que ela não quis.... mas a conversa fez-me avivar as minhas memórias, e retroceder até ao dia em que vi pela primeira vez uma bola de Berlim.

 

Tinha eu 9 anos quando fui para o ciclo, naquela altura o ciclo estava dividido por dois locais, o segundo ano era no edifício da escola e o primeiro era num velho casarão, as salas estavam divididas pelos diversos andares do velho edifício e por um anexo pré-fabricado que ficava no antigo quintal da mansão. Eu tinha aulas numa das salas do pré-fabricado e lembro-me de um dia em que a chuva e a saraiva eram tantas, que não nos conseguíamos ouvir dentro da sala.

 

O bar da escola era num pequeno vão de escada no 3º andar do casarão, quem tinha aulas nos anexos raramente entrava no edifício, o recreio era já ali. Demorei muito tempo a descobrir que havia um sitio onde comprar coisas, a primeira vez que lá fui foi a acompanhar alguém que ia comprar um pacote de batatas fritas para o lanche.  Em quanto o meu colega comprava as batatas fritas, fiquei a olhar para umas enormes bolas castanhas cobertas com açúcar branco. Lembro-me de perguntar o que era aquilo, e de alguém dizer:

 

-É uma bola!

-Uma bola?

-Sim, uma bola, é doce e tem creme!

-E quanto custa?

-5 escudos, queres uma?

-Não!

 

5 Escudos era muito dinheiro, para mim que não tinha nenhum era muitíssimo dinheiro, e estava fora de questão eu os obter para comprar um doce. Um dia, já os meus pais tinham emigrado e eu fora viver em casa da minha tia, descobri que não era preciso ter dinheiro. Além de bolos e batatas fritas, vendiam-se outras coisas, lápis, folhas, material escolar, coisas que de vez em quando eram necessárias, a senhora que geria o bar tinha um caderno onde anotava as coisas que cada um levava e no fim do mês enviava a conta. Descobri isso quando precisei de umas folhas para um teste e evidentemente não tinha dinheiro, alguém me explicou como funcionava, e lá se abriu a folha com o meu nome.

 

Não me lembro bem se foi no primeiro dia ou no dia a seguir, mas é evidente que a coisa seguinte que ficou anotada no livro foi:

 

-Bola - 5 escudos.

 

Ainda hoje consigo recordar o sabor daquela bola com creme. Os tempos mudam, tinha eu 9 anos quando vi pela primeira vez uma bola de Berlim, de certeza que se eu perguntar, nenhum dos meus filhos se lembra da primeira vez que as viu, no imaginário deles elas sempre existiram, junto com muitas outras coisas a que eu só tive acesso muito mais tarde.

 

A R. nem gosta de doces, eu também não gostava... porque nem sabia que eles existiam.

 

 

Jorge Soares

PS:Imagens retiradas da internet

publicado às 22:43


13 comentários

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De xana a 19.06.2009 às 00:05

Eram outros tempos, Jorge, e não tivessem sido assim, não terias história para recordar. São essas recordações que dão cor aos dias de hoje. Quantas vezes, com os meus primos recordamos os nossos tempos de garotos, e percebemos que os garotos de hoje não irão ter recordações tão doces da infância como nós. O brincar na rua, na areia, chegar a casa completamente "emporcados", cheios de pó e areia na cabeça, subir árvores, etc, hoje isso é quase uma miragem. Os garotos de hoje não podemos deixá-los ir sozinhos brincar na rua, mesmo que eles sejam responsáveis, existem muitos perigos, depois há toda a quantidade de aparelhómetros electrónicos que os prendem dentro do quarto, e convivendo cada vez menos com outras crianças, já para não falar em termos de alimentação, que para eles sempre existiram doces, hamburgueres, gelados, e tantas outras coisas. São os novos tempos, mas eu ainda sou dos velhos tempos e não lamento nem um bocadinho.
Um dia, conto uma história da minha infância e do conduto, se é que alguém sabe o que é conduto.
bjks
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De Jorge Soares a 22.06.2009 às 00:34

Olá Xana

Sem duvida eram outros tempos.

Somos o que já vivemos amiga....

Beijinho
Jorge
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De marta a 19.06.2009 às 00:46

Deliciosa, esta história, Jorge!

Parabéns :)

e vou ouvi-la, também!

abraço
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De Jorge Soares a 22.06.2009 às 00:35

Olá

Obrigado... a historia e a bola :-)
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De DyDa/Flordeliz a 19.06.2009 às 01:09

São coisas como esta que nos fazem crescer e ao recordar nos fazem sorrir. E se ainda hoje te lembras com prazer do gosto da "bola de berlim" é porque foi mesmo muito especial.
Claro que nada disto fará parte do imaginário dos nossos filhos. Mas...haverá com certeza outras peripécias, umas boas, outras menos boas, que lhes marcará a infância. A vida está sempre em mudança e também eles terão belas estórias para contar.
A nossa não foi melhor nem pior. Foi diferente. Vivemos a nossa época como foi possível e eles estão a viver a época deles.
Eu não voltaria atrás, porque mesmo admirando o antigo e ficando deliciada com histórias como a tua, gosto de progresso.
Não fico preocupada porque o meu filho não gosta de doces, mas porque alguns gostam e não os podem comer. Já era assim no meu e no teu tempo e continua a ser assim no tempo deles.

E quase me esquecia do mais importante - PARABÉNS!
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De Jorge Soares a 22.06.2009 às 00:36

OLá

Voltar atrás.. nunca, hoje as coisas são diferentes, mas são sem dúvida muito melhores...em todos os sentidos.

Beijinho
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De Maria a 19.06.2009 às 09:50

Já pensou em editar um livro com estas estórias?

PS - Enviei por mail o que me pediu. Recebeu?
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De Jorge Soares a 22.06.2009 às 00:37

Olá

Um livro?..... não, há por aí muita gente com muito mais talento que eu .... e não conseguem editar nada...eu gosto de escrever ..e de recordar... só isso.

Sim.. vi o seu mail... obrigado
Jorge
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De Teresa a 19.06.2009 às 16:20

Já tinha lido esta encantadora estória tua Jorge e agora que a reli fiquei com desejos de comer doces, coisa que também não sou grande fã...mas agora uma bola de berlim ia! :)

Bom fim-de-semana, Beijinhos***
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De Maria Eugénia Pinto a 20.06.2009 às 01:12

Olá
Estás um verdadeiro artista da Rádio e da TV, só falta o Disco e a cassete pirata.
Parabéns!
Gostei muito dessa história quando a li - fez-me recoradr coisas boas e outras menos boas mas, o importante é que me fez recordar...
Vamos ouvir a história...
Beijinhos
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De Jorge Soares a 22.06.2009 às 00:39

Olá

E tu és uma exagerada.... e afinal... a conversa estava tão ineteressante.. que nem ouvimos :-)

Beijinho
Jorge
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De José A a 23.06.2009 às 23:53

Engraçado que comigo, era com o Setubalense...um bolo baixinho com creme por dentro...juntava os tostões para poder comprar um na preparatória Paulo da Gama, Seixal.
E mais engraçado é que anos mais tarde, trabalhei numa pastelaria e entregava os bolos em quase todas as escolas do concelho...
Belas recordações...

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