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Porque: "A vida é feita de pequenos nadas" -Sergio Godinho - e "Viver é uma das coisas mais difíceis do mundo, a maioria das pessoas limita-se a existir!"
Imagem do Público
Podia ser uma noticia de 1º de Abril, uma daquelas brincadeiras que os jornais costumam fazer para enganar a malta, mas não é. A frase acima faz mesmo parte do acórdão que três juizes do tribunal da relação do Porto escreveram. Neste acordão uma empresa de Oliveira de Azeméis é obrigada a reintegrar um trabalhador que após um acidente com um camião de recolha do lixo, foi apanhado com 2.3 gramas de álcool no sangue. Note-se que já é a segunda instância e em ambos os casos se pede a reintegração do trabalhador.
Tudo começou no dia dos namorados do ano passado, numa qualquer curva da estrada, o camião do lixo tumbou para berma, o condutor acusou 1,79 e o acompanhante, que é quem deve ser reintegrado ao trabalho, acusou 2,3 gramas por litro. Acho que não restam dúvidas para ninguém que estavam ambos alcoolizados enquanto trabalhavam.
Os juízes invocam que nas normas da empresa não há nada que diga que não se pode trabalhar alcoolizado e por isso o trabalhador não pode ser despedido. A empresa diz que o trabalhador “Incorreu de forma culposa em gravíssima violação das normas de higiene e segurança no trabalho”
Não sou advogado e portanto não vou discutir aqui o espírito da lei, mas há coisas que me fazem confusão. Imaginemos por mero acaso que o senhor alcoolizado como estava, atingia um transeunte ou um carro (ou um dos juízes) com alguma peça de lixo, será que a interpretação da lei seria a mesma?
Percebo que se leve a lei à letra, o que já não entendo é para que foram necessários por partes dos juízes os comentários que até podem ser lidos como incentivo ao consumo de álcool durante o trabalho, era mesmo necessário escrever na sentença:
“Vamos convir que o trabalho não é agradável”, observam ainda os desembargadores Eduardo Petersen Silva, Frias Rodrigues e Paula Ferreira Roberto. “Note-se que, com álcool, o trabalhador pode esquecer as agruras da vida e empenhar-se muito mais a lançar frigoríficos sobre camiões, e por isso, na alegria da imensa diversidade da vida, o público servido até pode achar que aquele trabalhador alegre é muito produtivo e um excelente e rápido removedor de electrodomésticos”.
É claro que “Não há nenhuma exigência especial que faça com que o trabalho não possa ser realizado com o trabalhador a pensar no que quiser, com ar mais satisfeito ou carrancudo, mais lúcido ou, pelo contrário, um pouco tonto”, mas também duvido que exista alguma lei que aconselhe o trabalhador a enfrascar-se de modo a levar o trabalho com mais alegria... seja o trabalhador um juiz ou de uma empresa da recolha do lixo.
Anda o país a gastar rios de dinheiro em campanhas de sensibilização para diminuir o consumo de álcool e depois lemos coisas destas. Sinceramente não havia necessidade.
Jorge Soares