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Votar para abdicar da privacidade?

por Jorge Soares, em 27.09.16

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Imagem da internet 

 

A noticia é da RTP e diz :  "Suíços abdicam da privacidade em prol dos serviços secretos" no domingo passado, em mais um dos muitos referendos que se fazem no país helvético, mais de 65 % dos Suíços votaram a favor de uma  lei que vai permitir aos serviços  secretos espiolhar as vidas privadas dos cidadãos.

 

Isto acontece na mesma semana em que em Portugal se armou um enorme burburinho porque o governo enviou para aprovação do presidente da república, uma lei que permitirá aos bancos avisarem o fisco de qualquer um que tenha contas bancárias com mais de 50000 euros...  aposto que há muita gente por aí a rezar para que Marcelo vete a lei... é que há coisas que são dificeis de explicar ao fisco.

 

Curiosamente também aconteceu na mesma semana em que a minha filha mais velha ouviu falar de um senhor chamado Edward Snowden, que como se recordarão ficou conhecido porque mostrou ao mundo que  os serviços secretos americanos espiolhavam a vida privada não só dos americanos, como de muita gente mais ou menos importante pelo mundo fora.

 

Ela considera o senhor digno da maior admiração porque foi capaz de gritar ao mundo o que já todos mais ou menos sabíamos mas ninguém se atrevia a dizer e/ou a provar. 

 

Tal como ela aplaudo a atitude de Snowden, mas confesso que ante os últimos ataques terroristas e tendo a certeza que se tal como dizem os países Europeus, é verdade que se tem evitado muitos ataques terroristas nos últimos tempos, isto se deve a que algures há máquinas e sistemas a trabalhar e pelos vistos a funcionar bem. 

 

Tentei explicar à minha filha que entre o preto e o branco, há muitos  tons de cinzento pelo meio e que se calhar há alturas em que os fins justificam os meios....  acho que não tive muita sorte, talvez porque nem a mim me consigo convencer.

 

O problema de tudo isto é que dificilmente se conseguem impor limites ou controlar até onde chega quem tem as máquinas e o poder de as utilizar.. e depois acontece como nos Estados Unidos, começa-se por escutar os terroristas e termina-se a ouvir os telefonemas dos lideres de outros países sem importar muito se são amigos ou inimigos.

 

Na Suíça há algo que querem chamar democracia directa e tudo é referendável, desde os minaretes das mesquitas até à privacidade do cidadão, passando por se podem ou não expulsar  emigrantes... Em muitos casos o populismo leva a melhor e no fim dá asneira... como acho que aconteceu neste caso.

 

Em Portugal felizmente confiamos nas instituições para fazer as leis, o que será que acontecia se se fizesse um referendo para decidir se quem tem mais de 50000 Euros no Banco  tem ou não que explicar ao fisco de onde saiu o dinheiro? Ou se quem, tem património imobiliário com valor superior  a x mil euros tem que pagar um imposto especial?

 

Não é nada fácil decidir o que significa democracia directa ou o que é ou não privacidade.... mas eu teria uma enorme dificuldade em ser Suíço.

 

Jorge Soares

publicado às 23:17

Shame on you Angola

por Jorge Soares, em 20.10.15

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Imagem do Facebook  de Sofia Zambujo

 

Não alcançamos a liberdade buscando a liberdade,

mas sim a verdade.

A liberdade não é um fim, mas uma consequência.

Leon Tolstoi

 

José Eduardo dos Santos, que está no Poder desde 1979 e as únicas eleições a que se submeteu, foram a origem de uma guerra civil que deixou milhares de mortos... não se sabe quando vão ser as eleições.....

 

Escrevi a frase acima algures em 2009 num post sobre o Hugo Chaves, já choveu bastante em Angola e na Venezuela desde então, entretanto  "el comandante" foi-se e deixou no seu lugar um senhor que recebe os seus recados através do canto dos passarinhos e para a desgraça ser completa, o petróleo passou dos 100 para os 50 dólares por barril.

 

Na Venezuela o que mudou foi para pior, Angola terá mudado muito neste período de tempo, os dólares do petróleo converteram Luanda na cidade mais cara do mundo e alguns angolanos nos melhores clientes das lojas de luxo de Lisboa. Infelizmente todo esse dinheiro e aparente prosperidade não chegaram a quem mais precisa e ao mesmo tempo que cresciam os edifícios na cidade, crescia também a miséria, a insegurança e as desigualdades.

 

Era contra essa miséria e desigualdades que  erguiam as suas vozes Luaty Beirão e outros 14 jovens activistas  que foram detidos durante uma acção de formação de intervenção cívica e política, com base no livro “Da Ditadura à Democracia”, de Gene Sharp.

 

Luaty e os outros 14 jovens estão presos à quase quatro meses  acusados de um crime político, segundo o governo angolano, os jovens estariam a preparar uma rebelião e um atentado contra o Presidente angolano, mesmo que isto fosse verdade, este é  crime que admite liberdade condicional até ao julgamento, liberdade que tem sido negada aos jovens.

 

Luaty está em greve de fome há 29 dias em protesto por não ter sido libertado após o prazo máximo de prisão preventiva.

 

Tal como a Venezuela, Angola é um país com enormes recursos naturais, tal como na Venezuela toda essa riqueza parece que se desvanece em fumo por entre as mãos dos seus dirigentes e pouco ou nada chega a quem verdadeiramente precisa, o seu povo.

 

Luaty e os outras 14 jovens são a voz desse povo, não deixemos que os políticos calem essas vozes.

 

Jorge Soares

 

publicado às 21:59

O que significa o cravo vermelho?

por Jorge Soares, em 26.04.15

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Imagem do Público

 

Reza a história que no dia 25 de Abril de 1974 a revolução estragou o negócio à vendedora de cravos do Rossio, esta vendo que estes iam murchar, decidiu oferecer um a cada militar dos que estavam a fazer a revolução e que por ali passavam... e foi assim que o 25 de Abril ficou conhecido para o mundo como a revolução dos cravos.

 

Na sexta ao almoço chamou-me a atenção ver que Cavaco Silva fazia o seu último discurso como presidente da república nas cerimónias do 25 de Abril sem  um cravo na lapela e comentei o facto com a família.

 

Fiquei mais ou  menos chocado quando a R. que ainda por cima adora história e tira sempre excelentes notas nessa disciplina me perguntou:

 

-O que é que significa o cravo vermelho?

 

Considero o gesto de Cavaco Silva quase uma afronta, não só a quem fez a revolução que nos devolveu a todos a liberdade de pensar e de termos opinião, como a todo o povo português. Mas confesso que me assusta mais a forma como nos últimos 40 anos temos tratado o assunto.

 

É verdade que o facto de a minha filha não saber identificar o símbolo da revolução, também é culpa minha, é em casa que devemos transmitir os princípios, mas este não deveria ser um assunto que se dá na escola? Ela teve história até ao nono ano,  sempre foi uma excelente aluna nessa disciplina e a verdade é que esse capítulo tão importante da nossa história, quase lhe passou ao lado, porque raramente falaram disso nas aulas e quando o fizeram foi sempre ao de leve.

 

A mim o gesto de Cavaco Silva não me estranha, sempre olhei para ele como o menos democrático de todos os políticos que nos governaram nos últimos 40 anos, por ele e por mais alguns como ele, essa parte da nossa história era simplesmente apagada... assim como o tem sido nas aulas de história que foram dadas aos nossos filhos nos últimos 40 anos.

 

O cravo é o símbolo de uma revolução pacífica que devolveu a democracia ao país após muitos anos de fascismo e de falta de liberdade, não deveria ser um símbolo político, devia ser transversal e servir para que no futuro ninguém esqueça porque é que essa revolução foi feita... há quem queira que essa parte da nossa história seja esquecida....  talvez porque um povo ignorante da sua história é mais fácil de subjugar e de enganar.

 

Jorge soares

publicado às 22:41

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Imagem de aqui

 

O jovem da imagem chamava-se Kluiverth Roa, tinha 14 anos e há quem diga que nem se estava a manifestar, estava simplesmente por ali e cometeu o erro de gritar "parem com a repressão" aos polícias que de arma em punho tentavam silenciar os estudantes universitários que se manifestavam contra a inflação e a escassez de comida.

 

Kluiverth morreu de um disparo na cabeça, é o sexto estudante morto pelas forças policiais do estado desde o inicio das manifestações de estudantes há uma semana.

 

A situação social na Venezuela está a chegar a um estado de completa degradação, à insegurança, durante o ano 2014 foram assassinadas no país mais de 25000 pessoas, juntou-se uma inflação anual que está perto de atingir os 3 dígitos e a falta de bens de primeira necessidade.

 

O petróleo tornou-se na única fonte de recursos da Venezuela, com a descida dos preços para menos de 50 dólares por barril e o estado deplorável das infra-estruturas petrolíferas do país, levaram a uma descida abrupta da entrada de dinheiro.

 

A falta de dinheiro para a importação de matérias primas levou ao encerramento da maior parte das industrias nacionais e ao quase completo desabastecimento do mercado, para conseguir comprar qualquer produto de primeira necessidade, desde papel higiéncio a farinha, são necessárias horas e horas nas filas dos supermercados.

 

É contra este estado de coisas que se manifestam os jovens estudantes Venezuelanos, a resposta de Nicolás Maduro e do seu governo é enviar as forças militarizadas com armas de fogo para a rua, o que se traduz em forte repressão e em pelo menos seis estudantes mortos só numa semana.

 

Nicolás Maduro foi eleito em eleições democráticas, mas não é a forma como são eleitos os seus governantes que definem o tipo de governo de um país, em democracia o governo é eleito pelo povo e para o povo, neste momento o governo que foi eleito pelo povo parece estar no poder não para o povo mas sim contra o povo.

 

Durante o último ano foram utilizados todos os pretextos legais e ilegais para silenciar os protestos do povo, o principal dirigente da oposição está preso desde há mais de um ano porque pediu ao povo que se manifestasse contra a situação no país, durante o último ano foram presos para além de estudantes, políticos da oposição  e até o governador da Capital Caracas.

 

Enquanto o governo usa as forças policiais para reprimir os protestos do povo, há dirigentes do partido de governo que são acusados de dirigirem redes internacionais de tráfico de drogas e a corrupção faz desaparecer uma boa parte dos muitos milhões que entram no país.

 

Calcula-se que só em 2013 tenham entrado no país quase 140 000 milhões de Dólares proveniente da venda do petróleo, para onde foi todo este dinheiro? ninguém sabe.

 

Jorge Soares

publicado às 23:12

O Meu 25 de Abril

por Jorge Soares, em 26.04.14

25 de Abril

 

Antes. Para os brasileiros e mesmo para os meus compatriotas mais novos é praticamente impossível fornecer uma ideia clara de como se vivia em Portugal durante o Estado Novo – o regime que vigorou entre 1926 e 1974, sensivelmente com os mesmos valores: Deus, Pátria, Família. Ainda pensei fazer uma lista de situações que contextualizassem a vida de então, mas desisti de o fazer, tão descomunal me parece a tarefa.

 

Então, a 25 de abril de 1974, faz hoje 40 anos, na sequência de uma reivindicação corporativa, os oficiais menos graduados das Forças Armadas, capitães e majores, sobretudo, lideraram uma ação militar que derrubou o regime, ato que foi imediata, entusiástica e maciçamente apoiado pela população. Com tal unanimidade, durante os meses seguintes, nem o céu parecia o limite.

 

25 de abril, quinta-feira, 9 horas. O jovem atravessa o parque Eduardo VII em diagonal. Está dez minutos atrasado para o emprego, como habitualmente. À vista da rua onde trabalha percebe que o trânsito para o bairro está cortado por militares. Inquirido, um deles diz-lhe que não pode passar, sem mais explicações. O jovem volta para casa, conjeturando que tem uma boa desculpa para dar ao patrão, se ele o questionar nesse sentido. 

 

Pelas dez e meia ou onze, o jovem rejubila ao ouvir pela rádio que está em curso um movimento militar que parece querer derrubar o governo. O jovem lia frequentemente jornais que insinuavam, nas entrelinhas, mudanças políticas iminentes – um que vinha dos Açores impresso em papel cor-de-rosa e o Diário de Lisboa –, mas o governo representava para ele, sobretudo, a asfixiante ordem eterna, parada em conceitos desatualizados. Toda a gente dizia mal, numa impotência cómoda, porque havia a certeza de que o regime nunca mudaria. A prová-lo, estava o tosco “golpe das Caldas”, um mês antes. 

 

E da manhã, da tarde e da noite se faz o dia primeiro. Na tarde soalheira do dia 25 de Abril de 74, um casal estrangeiro, de língua inglesa, passeia pelo parque Eduardo VII, misturado com os outros passeantes portugueses que desfrutam o feriado inesperado. Dos lados da Baixa chegam, de quando em quando, sons de alvoroço popular. Não sei se o casal sabe o que se está a passar no país, mas o homem comenta, sorridente, para a mulher: “Deve ser por causa do Benfica!” Como está enganado!

 

No supermercado o jovem repara admirado que as pessoas estão a comprar quantidades anormais de víveres, sobretudo enlatados. Acha aquela atitude desproporcionada. Além de meia dúzia de polícias com cães, cosidos nos portais da António Augusto de Aguiar, com ar furtivo e preocupado, nada parece indicar qualquer ameaça de resposta da “situação”. 

 

À noite, na televisão, o jornalista apresenta a Junta de Salvação Nacional – uma mesa atestada de generais soturnos e mal-encarados.

 

Mas então? Onde estão os capitães de que falam as notícias? Não é que o jovem tenha, desde a tropa, uma grande consideração por capitães do quadro, mas generais? Spínola? Escreveu um livro crítico, e então? É do regime… Para que o poder “não caia na rua”, já vai ao beija-mão? 

E quem são os outros emproados? 

 

Alívio! As dificuldades do regime em conseguir quadros militares suficientes para sustentar a guerra do Ultramar obriga a certos estratagemas. Os oficiais milicianos que não tenham ido ao Ultramar, durante o tempo normal de tropa, podem ser novamente chamados, após alguns anos de dispensa. É-lhes dado um curso de capitães em Mafra e seguem para um dos teatros de guerra no Ultramar: Guiné, Angola ou Moçambique. Alguns preferem oferecer-se para ir a África durante o tempo normal e despacharem a questão, do que ficarem em risco de fazer tropa duas vezes. 

 

O jovem tinha feito três anos e três meses de tropa, mas sempre na Metrópole. Por duas vezes esteve prestes a ser mobilizado para o Ultramar. Sempre as circunstâncias o salvaram. Numa delas, outro se ofereceu para ir em seu lugar. Pelo 25 de abril, faltarão uns dois anos para ser eventualmente chamado de novo. De tempos a tempos, já tem sonhos onde se vê outra vez na tropa, o que não é muito agradável. Quando o discurso dos revoltosos de abril dá indicações de que a política ultramarina se irá alterar, o jovem sente um alívio enorme, enorme. [Vocês não veem, mas, apesar de o texto ser meu, ao relê-lo emociono-me.]

 

Comunistas. Antes do 25 de abril havia certos assuntos que se evitavam naturalmente. Um deles era comunismo. Os funcionários públicos tinham que jurar rejeitar a ideologia comunista. Sabia-se que o poder não gostava do conceito nem dos seus praticantes. A autocensura levou o jovem, certa vez, numa entrevista, a ficar atrapalhado por ter dito que gostava de ser útil à comunidade. Seria que isso poderia ser lido como proximidade de outras palavras com a mesma raiz? 

 

Três ou quatro dias depois do 25 de abril, as capas dos jornais anunciam a chegada de Álvaro Cunhal, líder máximo do Partido Comunista Português, nome que o jovem nunca tinha ouvido. O condicionamento fá-lo ter um momento de apreensão? O quê, os comunistas vêm aí, às claras, confiantes e aceites? Nesse momento, o jovem começa a tomar consciência de que estão a chegar tempos muito diferentes, não pelos comunistas em si, mas pela previsível abertura a múltiplas e variadas realidades até aí interditas. 

 

O primeiro 1º de Maio. O 1º de maio de 1974 é inesquecível. Ou antes, as manifestações. A manifestação de Lisboa começa na Baixa e dirige-se para o estádio do Inatel, já próximo do aeroporto. São muitos os milhares de pessoas a desfilar. Entre os primeiros a chegar e os últimos, talvez medeiem duas horas. Toda a tarde se desfila pela Almirante Reis acima. É um rio de gente a caminhar com um sentimento bom de reencontro, de partilha, de comunhão, de vitória sem raiva. Há um estado de graça nos sorrisos, no convite aos que estão pelos passeios, nas saudações a quem não se conhece. Não há ainda divisões. Estamos felizes. Estamos todos finalmente livres. Simplesmente. [Emoção.]

 

«Uma gaivota voava…» A sensação de liberdade, a convicção de que o destino de cada um passa agora pelas suas mãos, leva a que muitas pessoas quebrem as cadeias sociais ou rotineiras que as prendem. Há que levar a verdade não só ao político como ao social, à vida de cada um. Os divórcios saltam em flecha. A contestação nas empresas leva mais facilmente ao rompimento dos laços contratuais. A fuga de alguns empresários mais comprometidos, associada à convicção de que os patrões não têm função produtiva, logo são parasitas, leva a tentativas de controlo das empresas pelos trabalhadores. Pelo menos, tentar uma cogestão que devolva alguma verdade às relações de produção. O Estado é chamado a intervir em inúmeras situações, quer para legitimar a continuação da produção de empresas cujo proprietário fugira, quer para assegurar a gestão de empresas onde o conflito patrões/empregados ameaça paralisá-las. Desde grandes empresas até padarias, por exemplo. 

 

«… Como ela somos livres de voar.» A contestação, a reclamação de direitos nunca reconhecidos, faz surgir lutas nunca vistas. Uma que surge logo nas primeiras três semanas e que causa celeuma é uma luta das prostitutas, já não sei por que direito. A televisão – dois canais públicos a preto e branco – abre-se ao discurso popular, à queixa debitada pelo homem da rua. As pessoas têm finalmente acesso a divulgar os seus problemas. Os telejornais estão repletos de queixas, de afirmação de direitos, de cobertura das lutas laborais. Um dos programas mais populares trata de desmascarar práticas desonestas de comércio, com produtos fora de prazo, defeituosos, queixas de consumo, em suma. 

 

Tomar café na associação. A luta laboral vai levando a que o trabalho seja melhor pago, quanto mais penalizante seja para o trabalhador. O trabalho noturno pago por valores mais altos, leva a que a vida noturna da capital se altere, pelo menos ao nível das cervejarias e outro pequeno comércio de restauração. Algum deste comércio que fechava por vezes às 2 da manhã, passa a fechar muito mais cedo, devido aos novos valores do trabalho noturno, acho eu. A noite lisboeta fica mais triste, com menos oferta.

 

Os novos conceitos de “endinheirado igual a fascista”, levam a uma fachada contida e à retirada para núcleos mais restritos, uns, ou para os inúmeros núcleos associativos – cooperativas, sindicatos ou partidos –, outros. Aí são agora os novos locais de eleição para os encontros e os namoros. 

 

«O que se passa aqui, que tudo está tão diferente…?» De repente as coisas estão diferentes. Interessa mais o “ser” que o “ter”, há que ser solidário e não competitivo, há que participar ativamente nas tarefas que são de todos, a alfabetizar, a esclarecer, a ajudar em qualquer aspeto da vida coletiva da sociedade, nem que seja só colar cartazes, gerir a pequena associação cultural ou participar nas manifestações. 

 

De repente, o que se tinha aprendido está desatualizado. As relações políticas, sociais, familiares e até pessoais pautam-se por outras normas. Há a sensação de que é preciso desaprender tudo e aprender tudo de novo. Lê-se Engels, Lenine, Marx, Mao, Wilhelm Reich. Livros com títulos como “O que é a consciência de classe?”, “A conquista do pão” ou “A origem da família da propriedade e do Estado”, andam por algumas mesas-de-cabeceira. Aprender, aprender, recuperar o tempo perdido, é preciso. 

 

«A cantiga é uma arma.» Entretanto, os militares, cuja consciência política, na maioria, parece advir das mensagens emocionais contidas nas canções de intervenção, começam a absorver as ideologias dos partidos e a dividir-se. O ano que se segue é um carrocel de factos políticos, com os partidos a tentarem controlar as diversas tendências que os militares vão manifestando, em osmose de ideias políticas.

 

O jovem passa a noite a ler e a ouvir rádio – o horário de trabalho permite –, na esperança de notícias condizentes com as suas aspirações, mas sobretudo a absorver as mensagens e as emoções contidas nas inúmeras canções revolucionárias que vão surgindo em catadupa. Quando a luz do dia enche a rua, descansa finalmente.

 

Há duas tentativas falhadas de controlo do processo pela direita. A seguir, o bloco central pressiona a extrema-esquerda, que está muito aguerrida por ver fugir-lhe espaço de manobra. A 25 de novembro de 1975 é derrotada e o país inicia um processo de estabilização política em moldes tradicionais.

 

Adeus! O jovem sente que a cinza de novembro regressa. Ou pensa que sim. Não fora alfabetizar as populações do interior, não ocupara casas devolutas para famílias carenciadas, não participara em atividades das cooperativas agrícolas ou outras. Quase não “mexera uma palha”. Tivera uma adesão intelectual, pequeno-burguesa e romântica. Ainda assim, está muito abatido. Só lhe apetece emigrar. Mas, falta-lhe coragem.

 

Joaquim Bispo

 

Retirado de Samizdat

publicado às 21:30

É isto a democracia directa!

por Jorge Soares, em 10.02.14

Não à emigração

 

Imagem do Público

 

 

Na maioria das vezes em que aqui se fala da Suíça é porque aconteceu mais um referendo, primeiro foi o referendo aos minaretes, depois foram os referendos à diminuição de impostos e ao aumento dos dias de férias, ambos derrotados, hoje para não variar temos mais um referendo, referendo à manutenção da livre circulação de pessoas, o que na realidade se traduz, como: referendo à emigração.

 

Ouvimos muitas vezes o termo democracia directa, isto é a democracia directa, o que aconteceu este fim de semana na Suíça é isso mesmo, democracia directa, metade e mais um bocadinho dos suíços, 50,3 %, decidiu que estava na hora de atirar os acordos com a união europeia às malvas e voltar a fechar as fronteiras à emigração.

 

A Suíça é desde há muito um dos principais destinos da emigração portuguesa, mas não só, quase um quarto da população do país é constituído por emigrantes. 

 

Acontece que anexado ao acordo de livre circulação havia uma série de outros acordos que hoje estão em causa, a Suíça será, até pela sua situação física no mapa da Europa, o país de fora da união europeia que mais relações tem com a  comunidade, agora tudo isso está posto em causa e resta saber até que ponto haverá no seio da comunidade a força suficiente para fazer cumprir as regras à letra.

 

Assim de repente o que parece é que quem tem mais a perder com tudo isto é a Suíça e os suíços, há por exemplo muitíssima gente que vive em França, na Itália, na Alemanha e que trabalha na Suíça, a implementação de controlos nas fronteiras e o fim dos acordos comerciais iria tornar tudo isto quase impossível.

 

Há uns meses a Espanha decidiu implementar os controlos normais na fronteira com Gibraltar, que é fora do espaço Schengen, e foi o caos, imaginem-se o que seria implementar estes controlos nas fronteiras Suíças.

 

Por outro lado, a Europa não depende do mercado Suíço, poderia viver perfeitamente com uma ilha no meio, a Suíça está rodeada pela União Europeia, é até difícil de imaginar como seria a vida deste país de costas voltadas para todos os seus vizinhos se estes levassem as regras à letra e deixassem mesmo cair os tratados.

 

Há muito quem advogue as vantagens da democracia directa, hoje vemos as desvantagens, nem sempre as pessoas tem a capacidade de ver o filme todo, os referendos servem muitas vezes para avalizar as vontades de governantes sem escrúpulos que fazem do populismo uma forma de governo.

 

Não há sistemas perfeitos, mas eu confesso que entre a nossa democracia representativa e esta em que tudo se pode questionar e referendar, e em que muitas vezes se vota ao sabor do momento e dos interesses pessoais, eu prefiro o nosso.

 

Jorge Soares

publicado às 23:11

Salgueiro Maia

Já deixei aqui a minha opinião sobre o facto de Amália estar no panteão nacional e sobre a forma rápida e até atabalhoada se decidiu que Eusébio para lá irá. 

 

Salgueiro Maia foi um dos exemplos que utilizei na resposta a alguns dos comentários do post sobre o Eusébio, como sendo uma das personalidades que eu entendia que juntamente com Saramago ou Fernando Pessoa, teriam lá lugar antes de jogadores de futebol ou cantantes de fado. Ontem quando ouvi Manuel Alegre sugerir que este fosse para lá trasladado fiquei curioso sobre qual seria a reacção do mesmo parlamento que há tão pouco tempo decidiu de forma consensual a entrada de Eusébio.

 

Por muito importantes que fado e futebol tenham sido para o país e para os sonhos e ilusões de muita gente, acho que a democracia é de certeza muito mais importante e quem sabe como a ela teríamos chegado sem a acção forte e decidida de Salgueiro Maia no dia 25 de Abril de 1974.

 

Para mim o consenso gerado no parlamento à volta de Eusébio tem mais a ver com o Benfica e com oportunismo político que com o verdadeiro sentimento dos deputados ou mesmo do país.

 

Curiosamente os mesmos senhores deputados que tão rapidamente decidiram há uns dias, agora já tem dúvidas e até acham que não se pode banalizar a coisa, segundo o líder parlamentário do PSD deve ser criado "um procedimento que não faça desenvolver no país uma tentação de poder agora a cada semana ou a cada mês haver uma proposta para uma trasladação para o panteão nacionall".

 

Será que os senhores deputados não percebem que foram eles que abriram a porta da banalização do Panteão nacional ao aceitarem a entrada de Amália e Eusébio?

 

Para muita gente Amália e Eusébio são símbolos imortais do país, pelos vistos Salgueiro Maia é só mais um português banal. O que podemos pensar de um país que eleva à tribuna de heróis a jogadores de futebol e fadistas, mas deixa morrer no esquecimento a quem se dispôs a dar a vida pela democracia e a liberdade de todos.

 

Concordo plenamente que o Panteão não pode ser um passeio da fama, mas para mim isso aplica-se a Eusébio e Amália, nunca a Salgueiro Maia.

 

Sempre achei que o país foi de uma enorme ingratidão com um homem que teve um papel fulcral no 25 de Abril, ingratidão que começou em vida e que pelos vistos se mantém após a sua morte.

 

De resto faz-me uma enorme confusão que Eusébio gere consenso entre os partidos e Salgueiro Maia não, há de certeza algo de errado na forma como lidamos com a nossa história contemporânea.

 

Jorge Soares

publicado às 22:31

Mandela

 

Imagem de Pontos de Vista

 

Haverá poucos homens no mundo que tenham dado tanto pelos seus e pelo seu país. Durante mais de 20 anos liderou uma campanha pacífica e não violenta contra o Governo da África do Sul e as suas políticas racistas. Com Oliver Tambo depois fundou um escritório de advocacia que dava aconselhamento a negros que não dispunham de representação.


Foi preso em 1956 junto com mais 150 pessoas e passou 27 anos da sua vida preso, tornou-se o prisioneiro mais famoso do mundo e mesmo de dentro da prisão nunca deixou de lutar pela liberdade dos seus. Ao fim de todo este tempo  surgiu como o líder do ANC (Congresso Nacional Africano)  e liderou este partido  para conduzir a transição da África do Sul para a democracia e a igualdade após 46 anos de um regime baseado no racismo e na segregação racial.


Foi o primeiro presidente da África do Sul eleito democraticamente e o primeiro presidente negro, em 1993 ganhou o Nobel da Paz. O Dia Nelson Mandela foi instituído em 2009 para celebrar a sua vida e a chamada à acção que fez ao longo da sua vida. Celebra-se a 18 de Julho e, propositadamente, não é um feriado para que inspire todas as pessoas em todo o mundo a trabalharem pelos valores que Nelson Mandela defendeu ao longo de toda a sua vida.

Hoje o mundo ficou mais pobre, morreu Madiba, um símbolo da democracia, da liberdade, da igualdade, o seu exemplo perdurará para sempre e a sua história servirá de farol a todos os que acreditam na liberdade e na igualdade entre todos os seres humanos


Jorge Soares

publicado às 21:59

Nuno Crato em versão quero, posso e mando!

por Jorge Soares, em 29.11.13

Crato, Indignação na educação

Retirado do Público

 

O ministro Nuno Crato decidiu que no próximo ano lectivo haverá um novo regime jurídico de formação para a docência, um novo regime que daqui até ao inicio do novo ano lectivo deverá alterar não só a forma de acesso aos cursos de educação, como também os currículos dos mesmos. “As instituições devem remeter à A3ES, até 60 dias úteis após a entrada em vigor do presente diploma, os pedidos de acreditação dos ciclos de estudos que pretendam colocar em funcionamento em 2014/2015”,

 

Ou seja, o ministro decidiu que todo o sistema de formação para a educação irá ser alterado de uma ponta à outra num prazo de seis meses e decidiu à melhor maneira do "quero posso e mando",  sem consultar nem a Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior, nem as universidades, nem os institutos politécnicos.


Serão afectados todos os estudantes actuais e futuros dos cursos de educação do país mas segundo a noticia do Público, o ministério já nem admite acreditar os cursos actuais para o próximo ano lectivo.

 

Todas as instituições deverão em menos de sete meses preparar e fazer aprovar os novos currículos dos cursos superiores, e ao mesmo tempo preparar e aprovar as regras de transição dos actuais para os novos currículos para os alunos que já se encontram na universidade.

 

Tudo isto terá sido decidido pelo ministério da Educação sem nenhum tipo de discussão ou consulta com as escolas do ensino superior... tudo muito democrático portanto.

 

Jorge Soares

 

publicado às 23:38

Abstenção

 

Imagem do Público

 

"A TVI assinou o programa mais visto da noite: a estreia do reality show Casa dos Segredos, com 1,7 milhões de espectadores. Os especiais autárquicas ocupam o top cinco: o da TVI, seguido pela RTP1 e só depois a SIC"

 

Terão sido os que não votaram os mesmos que à hora em que se sabia quem os iria governar, estavam a ver a casa dos segredos?

 

Gostava de perguntar a alguém de Oeiras que não tenha ido votar, o que achou da caravana vitoriosa que depois de conhecidos os resultados foi em peregrinação até à cadeia da Carregueira a prestar vassalagem ao grande líder?

 

A abstenção chegou aos 47,4 %... ficou a uma unha negra de ser maioria... há quem ache que os políticos retiram alguma lição disso... talvez alguns retirem, mas não me parece que sejam os que estão habituados a vencer.

 

Há quem tenha as mais elaboradas teorias sobre o suposto efeito da abstenção na politica nacional, há até mitos sobre uma suposta lei que diz que em caso de a abstenção ser maioria as eleições não valem... há, ideias e teorias para todos os gostos.. a realidade é que para O PS e o PSD, haver abstenção ou não será a mesma coisa, os seus apoiantes vão sempre votar e eles tem os votos garantidos... o resto, é conversa.

 

O que teria acontecido no Porto se em lugar de irem votar em alguém diferente, quem votou em Rui Moreira se tivesse abstido?

 

Só daqui a uns tempos iremos perceber se afinal Rui Moreira é mesmo diferente, se representa aquela pedrada no charco que faz falta para criar uma onda contra os partidos tradicionais e os políticos de sempre, ou se será mais do mesmo... mas para já a sensação que nos fica é que as coisas podem ser diferentes... basta que alguém acredite que pode  fazer diferença e que muitos não se abstenham de ir votar.

 

É verdade que votar é um direito democrático que cada um pode exercer como lhe apeteça... e isso até pode ser não votando, mas desengane-se quem acha que a abstenção pode fazer a diferença... Como se provou no Porto e em alguns concelhos onde em lugar dos partidos ganharam listas de cidadãos, o que pode fazer diferença é ir lá e votar... não nos mesmos de sempre mas nos que realmente podem ser diferentes.

 

Há pouco alguém me fez chegar um vídeo onde Marinho Pinto no seu jeito demagogo e espalha brasas de falar, fazia um grande alarido sobre o facto de os partidos receberem 3 Euros por cada voto... gostava de perguntar a Marinho Pinto qual é a alternativa que ele sugere?, 

 

O financiamento dos partidos políticos faz parte da democracia é conhecido e está devidamente legislado, a alternativa é que esse financiamento se faça através de escuras negociatas e trocas de favores... é mesmo isso que queremos? 

 

Jorge Soares

publicado às 21:56


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