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Porque: "A vida é feita de pequenos nadas" -Sergio Godinho - e "Viver é uma das coisas mais difíceis do mundo, a maioria das pessoas limita-se a existir!"
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Vi a noticia no Público e fiquei para além de incrédulo, curioso com o seguinte:
"o dux da Universidade de Coimbra, João Luís Jesus, defende que em muitas instituições do ensino superior não há “algo que justifique as suas praxes”, fazendo cópias "com desvios" do que é feito na mais antiga universidade portuguesa. "Noutros sítios, sujam-se os caloiros com lama, ovos ou farinha, quando isso, em Coimbra, é expressamente proibido"
Em primeiro lugar a fotografia acima é das praxes em Coimbra, de onde tirei esta há mais do mesmo estilo, sobre aquela parte de não se sujarem os caloiros com lama, ovos ou farinha, estamos conversados.
Em segundo lugar fiquei perplexo com as 24 matriculas, em Lisboa no Técnico em que eu andei e noutras universidades que conheço, há algo que se chama prescrição, normalmente os alunos tem que aprovar um certo número de créditos num determinado tempo para se poderem inscrever no ano seguinte, pelos vistos em Coimbra não é assim, caso contrário ninguém conseguiria acumular 24 inscrições...e sim, as dele são seguidas.
Fui ao Google e meti o nome do senhor, os dados são públicos e estão ao alcance de quem quiser ver, pelo que não estou a revelar segredo nenhum... e descobri que ele entrou para a universidade em 1989, precisamente o mesmo ano em que eu entrei da primeira vez... vai fazer 25 anos.
Ora nestes 25 anos eu tirei de um curso superior e enquanto estudava trabalhava nos tempos livres, arranjei emprego, casei-me, mudei de emprego, tive um filho, adoptei outro, entrei para outra universidade, tirei outro curso superior, adoptei outro filho.... ou seja, passei 25 anos a tentar construir uma vida.
Ele é dux e até dá entrevistas para os jornais.
Alguém me explica como é que se consegue estar 25 anos na universidade? Evidentemente eu não tenho nada a ver com a vida do senhor, cada um vive como quer e do que quer ... mas 24 matriculas? A sério?
Jorge Soares
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Dux ... a palavra entrou-nos de repente pela porta dentro, apesar das minhas duas passagens pelo ensino superior, nunca a tinha ouvido até agora, sempre achei que as praxes eram simplesmente manifestações espontâneas de parvoíce generalizada em que os alunos do segundo ano se vingavam nos caloiros pelo que tinham sofrido no ano anterior. Foi por isso com um enorme espanto que percebi que afinal as praxes são os mecanismos de iniciação a qualquer coisa que tem mais a ver com seitas e religião que com o ensino superior e academia.
Pelos vistos no topo da seita há alguém que se faz chamar Dux e que tem entre as suas prerrogativas a de iniciar os vários responsáveis pela iniciação do povo.
Tenho estado a seguir com atenção os comentários ao Post "Carta aberta a um dux" primeiro no Pés no Sofá (onde os comentários foram encerrados) e depois no Pontos de vista onde continuam abertos e a coisa aqueceu. Fico parvo com algumas coisas que se dizem, há quem defenda as praxes com unhas e dentes e há até quem entenda que que o que aconteceu no Meco não interessa a mais ninguém que a quem lá estava e às famílias, como se a morte de seis pessoas pudesse de alguma forma ser um assunto privado.
Vi também com alguma atenção o documentário Praxis de Bruno Moraes Cabral que nos mostra alguma da realidade das praxes e onde dá para perceber perfeitamente o espírito da coisa, o que se vê ali não passa de um mostruário de abusos e humilhações cometidas por uns supostos doutores sobre os pobres estudantes que acham que tem que passar por aquilo tudo, e tudo podem ser muitas coisas, para serem aceites.
O documentário foi filmado de norte a sul do pais em várias universidades diferentes e o espírito é o mesmo em todos lados, não é uma amostra do pior que se faz, é uma amostra de uma parte do que se faz e que para mim não foi novidade nenhuma, as minhas recordações do que vi nas duas faculdades em que andei eram mais ou menos à volta do que foi mostrado: abusos e humilhação pura e completamente gratuita.
Há muito que quem diga que as praxes foram essenciais para a sua integração e formação pessoal, ora o masoquismo é uma tara conhecida, não fazia ideia é que estava tão generalizada na sociedade portuguesa, dizer que é preciso ser sujeito a abusos e humilhações para se crescer como estudante e pessoa só pode ser sinal de masoquismo.
Acredito que existam praxes e praxes e que nem tudo será assim tão mau, como pai e cidadão preocupa-me seriamente que na maioria dos casos as praxes não passem disso, de humilhação e abusos e que por trás de tudo isto já exista uma organização que foge ao controlo das faculdades e até da sociedade.
Não sei o que se passou no Meco, tenho sérias duvidas que alguma vez se saiba sem sombra de dúvida, até porque não sabemos se o Dux alguma vez sairá do seu estado amnésico, ou se quando o fizer recordará o que se passou, o que ele acha que se passou ou o que ele desejava que se tivesse passado.
Sei que estivessem eles num ritual à beira mar ou em simples conversa na areia, nada disto se teria passado desta forma se não existissem uma comissão de praxes a ser iniciada e um Dux, e sei que queiram ou não os defensores das praxes e do que lhes está associado, está na altura que as universidades ou em seu lugar o a sociedade e todo país, tomem consciência do que se está a passar, até porque não é a primeira vez que há mortos, feridos e processos em tribunal associados às praxes.
Infelizmente o documentário não está disponível na net, mas deixo um trailer e a opinião do realizador
Jorge Soares