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Conto, O Maneirinho

por Jorge Soares, em 23.04.11
O Maneirinho

 

Dircelina, lembrava-se bem daquele dia, tinha chegado com a maleta de mão, e por companhia trazia a sua cor negra, a pouca escolaridade e o estigma de um país em guerra. Vinha para trabalhar, neste, que era visto por lá, como a árvore das patacas, e por via disso, a esperança tinha-lhe feito companhia durante toda a viagem, e já antes, nos preparativos que antecederam a partida a aconchegara, lhe soprara quente no peito e lhe dissera em surdina: vais conseguir.


Para trás ficava a família; mãe, duas filhas pequenas e quatro irmãos, um deles estropiado e que era tudo o que a guerra não tinha levado, mas nisso não quis pensar, aquela, era a altura das grandes tarefas o momento que ambicionou e não tinha receio de confrontar, para isso, contava com outra grande amiga: a vontade inabalável de vencer.

 

Aquele emprego, que um antigo amigo do seu pai lhe arranjara, não era o que pensava, esteve para o recusar, não o fez por causa da fome miserável que já há dez dias e dez noites a acompanhava, mas hoje, dez anos passados, sabia que tinha ganho a grande prova. A tristeza do primeiro dia em que se deitou com um cliente e depois todos os outros que seguiram, eram passado, assim como as lágrimas que abriram sulcos nas suas faces de ébano. O desejo dos homens, pelo seu corpo esguio e musculado do trabalho na sanzala, tinha-lhe garantido uma posição privilegiada entre as escravas do Maneirinho, e desde muito cedo traçara o seu plano.

 

A vinda da família, acontecera já depois de ter conseguido casar-se com o Maneirinho, a seguir, foi um passo, até o convencer a investir o dinheiro ganho com a escravatura e outros expedientes, num restaurante que ela e a mãe passaram a gerir, por fim, ele começou a gostar daquele chá que com receita da sua avó a mãe lhe ensinou a fazer, e que provocava no Maneirinho o estado esfusiante de alucinada embriaguez, e foi nesse estado que o convenceu ser ele capaz com a força do querer, parar o rápido Lisboa-Sintra.


Ainda lhe notou a incerteza no olhar, quando no meio da linha viu o comboio aproximar-se, mas ela, postada no apeadeiro, deu-lhe a força que faltava, gritando-lhe, és capaz meu querido, tu és capaz de tudo.

 

Espreitador

Retirado de Rua dos contos

publicado às 21:05


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