O Post de ontem fez-me pensar, há coisas na vida que nos marcam, palavras, lugares, pessoas, situações, hoje de manhã sozinho no carro, pensava no cais das Colunas e de repente a minha mente vagueou para muito mais longe, para o outro local que referia no desafio do outro dia, a varanda da biblioteca da UCV .... recordei pessoas, momentos únicos , olhares, sorrisos, .... atrás das pessoas vieram outros momentos, até que a minha mente se deteve.
Devia ser uma sexta à tarde porque estávamos sentados na relva, discutíamos de tudo, desde politica à musica de moda, por vezes cantávamos , havia sempre vários litros de sumo de maracujá e/ou laranja, e rum, vodka, anis.... eram as nossas sextas-feiras, unia-nos a amizade, muita cumplicidade e o gosto pela convivência. O local era La Tierra de Nadie , um enorme relvado com arvores e palmeiras, na orla da Faculdade de Ciências, entre a avenida e este jardim havia um campo de beisbol .
Era uma sexta Feira como outra qualquer, estava El Loco Miguel, mi hermano El Gordito Hector , El Arabe Kamil , Manolo el gallego, La loca Elsa , la gordita Peggy, Dulce.. . Na avenida, como tantas outras vezes havia distúrbios , um grupo de encapuçados saiu sorrateiramente da universidade e estava a queimar um autocarro. Nós bebíamos e sorriamos, nada do que se passava lá fora era connosco, e aquilo era tão habitual.... chegou a policia e perseguiu os encapuçados que procuraram refugio na universidade donde a policia não entrava...coisas de autonomias universitárias.
De repente sentimos um assobio, alguém sorria, a Peggy dava uma das suas gargalhadas..não deve ter ouvido, os restantes ficamos em silêncio, olhamos uns para os outros incrédulos , sem reacção , a Peggy perguntou "Que paso ?, que les pasa ?"
Aquela bala tinha passado pelo meio do grupo, talvez uns centímetros à direita ou à esquerda e eu, ou um dos outros, não voltaríamos a sorrir, e a falar de politica, ou a cantar as ultimas musicas de moda.
Às vezes tenho saudades de mim, saudades das pessoas de quem gosto, saudades dos amigos, por vezes tenho pressa em dizer as coisas, em fazer ver o quanto gosto de alguém, porque a sorte não bate duas vezes à mesma porta e depois...depois é tarde.
O meu olhar é nítido como um girassol.
Tenho o costume de andar pelas estradas
Olhando para a direita e para a esquerda,
E de vez em quando olhando para trás...
E o que vejo a cada momento
É aquilo que nunca antes eu tinha visto,
E eu sei dar por isso muito bem...
Sei ter o pasmo essencial
Que tem uma criança se, ao nascer,
Reparasse que nascera deveras...
Sinto-me nascido a cada momento
Para a eterna novidade do mundo...
Creio no mundo como num malmequer,
Porque o vejo. Mas não penso nele
Porque pensar é não compreender...
O Mundo não se fez para pensarmos nele
(Pensar é estar doente dos olhos)
Mas para olharmos para ele e estarmos de acordo...
Eu não tenho filosofia: tenho sentidos...
Se falo na Natureza não é porque saiba o que ela é,
Mas porque a amo, e amo-a por isso,
Porque quem ama nunca sabe o que ama
Nem sabe por que ama, nem o que é amar...
Amar é a eterna inocência,
E a única inocência é não pensar...
De:O Guardador de rebanhos, Alberto Caeiro
Jorge
PS:dedicado a ti!